Distúrbio hereditário do metabolismo do ferro que leva a absorção elevada e comprometimento tardio do fígado, coração e pâncreas.
Ocorre na população branca com ancestrais europeus, principalmente nórdicos.
Manifesta-se em homozigotos com mutações cromossômicas (genes HFE) nas posições C282Y (80 a 85% dos casos) ou H63D ou S65C.
Podem ocorrer em heterozigotos que apresentem a mutação C282Y com outra mutação H63D ou S65C.
Existem também outras formas genéticas relacionadas a genes não HFE, tais como mutação da tranferrina, hemocromatose juvenil (mutações da hepcidina e da hemojuvelina), e mutação da ferroportina.
Os exames genéticos possibilitaram a identificação destas mutações em familiares de pacientes que apresentam hemocromatose e que por motivo desconhecido não desenvolveram a doença. Seguindo-se estes pacientes observa-se que 70% dos pacientes apresentam expressão fenotípica e 10% desenvolverão complicações relacionadas à doença.
Os pacientes com alterações genéticas são divididos em 3 grupos:
1) Suscetibilidade genética – níveis normais de ferro, sem sobrecarga tecidual;
2) Níveis aumentados de ferro sem dano tecidual
3) Níveis aumentados de ferro com dano tecidual
Entre os pacientes que apresentam sobrecarga de ferro, dividem-se em:
1) Causas genéticas
2) Causas secundárias (anemias, hemólises, reposições inadequadas, transfusões, outras)
3) Causa mistas
A fisiopatologia da lesão tecidual ocorre através de 4 mecanismos:
1) Absorção excessiva de ferro no trato digestivo alto;
2) Redução da expressão do hormônio regulatório hepcidina;
3) Alteração da proteína HFE;
4) Deposição e fibrose induzidas pelo ferro
Quadro Clínico
Enquanto 1/250 brancos pode apresentar alterações genéticas para hemocromatose, apenas 1/2500 (10%) desenvolvem alterações bioquímicas ou clínicas compatíveis com a doença.
Mesmo em homozigotos, apenas 70% desenvolvem sobrecarga de ferro (mais homens que mulheres) e uma porcentagem bem menor desenvolve complicações clínicas.
Fadiga, dor abdominal, artralgias, condrocalcinose, impotência, perda da libido, manifestações de insuficiência cardíaca e diabetes são manifestações clínicas relacionadas à sobrecarga de ferro. Sinais clínicos podem ser hepatomegalia, cardiomegalia, atrofia testicular, artrites, alterações da pigmentação da pele.
Atualmente a maioria dos pacientes detectam as alterações genéticas ou bioquímicas durante check ups ou rastreamentos familiares. Mulheres parecem ser protegidas pela menstruação.
O fluxograma de avaliação encontra-se abaixo:
A ferritina pode estar elevada em doenças hepáticas virais, alcoólicas ou esteatohepatite.
A saturação de transferrina > 45% é considerada anormal e indicativa de pesquisa de hemocromatose e eventual biópsia hepática nos pacientes com ferritina elevada.
Ferritina < 1000 ug/ml é considerada fator de baixo risco para o desenvolvimento de cirrose hepática.
Homozigose C282Y com ferritina < 1000 ug/L levam a um risco de cirrose < 2%.
Homozigose C282Y com ferritina > 1000 ug/L indicam um risco de cirrose de 20 a 45%.
Ferritina > 1000 ug/L, com alteração de transaminases e plaquetopenia indicam uma chance de já existir cirrose hepática em 80% dos pacientes.
Todos pacientes com cirrose tem concentração hepática de ferro > 200 umol/g.
Em estudos com biópsia de 350 pacientes homozigotos C282Y, 5% dos homens e 2% das mulheres desenvolveram cirrose, todos com ferritina > 1000 ug/L.
Estudo australiano mostrou que > 60% dos pacientes com hemocromatose que ingeriam > 60 g de álcool por dia desenvolviam cirrose hepática.
A Ferritina é portanto o fator prognóstico mais importante na hemocromatose C282Y homozigotos, não havendo indicação de biópsia quando for menor que 1000 ug/L exceto se houver uso de álcool ou elevação de transaminases.
O tratamento da hemocromatose deve ser realizado nos pacientes que apresentam sinais de sobrecarga de ferro. O início precoce do tratamento previne cirrose e HCC.
Pacientes homozigotos com ferritina elevada devem fazer sangria e a periodicidade deve ser definida pelos níveis de ferritina.
Nos EUA, o sangue retirado de pacientes com hemocromatose , sem outras doenças ou alterações , é considerado seguro para doação.
Suplementação com vitamina C deve ser evitada em pacientes com sobrecarga de ferro uma vez que ela pode mobilizar ferro para a circulação, saturar a transferrina e levar a efeito tóxico oxidante.
Tratamento da Hemocromatose
Hemocromatose Hereditária
uma sangria por semana ou a cada 2 semanas (500 mL)
dosar Hb/Ht antes de cada sangria
nao permitir queda do Hb/Ht > 20%
dosar ferritina após 10 a 12 sangrias
interromper sangrias quando ferritina entre 50 e 100
manter ferritina entre 50 e 100
evitar vitamina C
Hemocromatose secundária
Deferoxamine (Desferal) – dose de 20-40 mg/kg/dia
Deferasirox (Exjade) oral
biópsia hepática
evitar vitamina C
As flebotomias retiram da circulação 250 mg de ferro/procedimento, enquanto a restrição de dieta retira até 4 mg/dia, sendo controversa a recomendação de restrição de ferro na alimentação.
As metas de ferritina devem ser entre 50 e 100 ug/L.
AASLD 2011.